sexta-feira, 1 de outubro de 2010

MENTIRA NÃO É O ANTÔNIMO DE VERDADE. É CONTRADIÇÃO. VERDADE?

(Artigo publicado no Jornal Cidadela em 23/09/10)


Na verdade, o assunto de hoje é uma continuação do último artigo (quando a prática fica na teoria). Resolvi desmembrá-los para não haver conflitos epistemológicos entre os termos e, assim, evitar prejuízos em suas compreensões.

Mas quando tratei sobre teoria e prática, intrínseco ao texto estava a questão da mentira e contradição, que ora revelo.

Pelo que entendi nas minhas pesquisas internéticas, muitas pessoas consideram mentira como sendo o contrário da verdade (senso comum), inclusive eu. Não é nada disso e vou mostrar-lhe o meu ponto de vista sobre esse assunto, iniciando com a análise do seguinte versículo:

“Nenhuma mentira vem da verdade.” (1 João 2,21)

Partindo dessa afirmação bíblica, e sem querer debater sobre religião, por si só já definiria a questão suscitada: mentira não é o antônimo de verdade.

Ora, se mentira não é o antônimo de verdade, o que seria então? Intrigante a situação que me fez buscar outras explicações para tal impasse.

Intrigado, recorri ao Aurelhão para iniciar minha tese. Pesquisei sobre os seguintes significados que julguei, a principio, cabíveis: mentira, falsidade, verdade, omissão, contradição e divergência, em busca de dualidades que me fizesse chegar a uma conclusão (a minha).

Em linhas gerais, os resultados encontrados foram:

• Mentira: Ação ou efeito de mentir. Ludíbrio; falsidade; ilusão.

• Falsidade: Propriedade do que é falso. Mentira, calúnia. Hipocrisia; perfídia. Delito que comete aquele que conscientemente esconde ou altera a verdade.

• Verdade: Identidade de uma representação com a realidade representada; exatidão, autenticidade: verdade histórica. O que é certo, verdadeiro: quer sa-ber a verdade. Princípio certo, constante; axioma: ver-dade matemática. Boa-fé; sinceridade: falar com verdade. Expressão fiel da natureza: retrato de grande verdade. Em verdade ou na verdade, certamente, se-guramente, decerto.

• Omissão: Ato ou efeito de omitir. Falta, lacuna. Falta de ação no cumprimento do dever; inércia; desídia.

• Contradição: Ato ou efeito de contradizer(-se). Incompatibilidade entre alegações atuais e anteriores, entre palavras e ações: cair em contradição. Oposição, objeção. Espírito de contradição, disposição de contra-dizer incessantemente. Lógica, Princípio de contradi-ção, o princípio segundo o qual uma coisa não pode ao mesmo tempo ser e não ser; a regra que dá como ca-ráter da verdade a exclusão de toda contradição. Sem contradição, incontestavelmente.

• Divergência: Discordância, desacordo.

Nossa! Dentre tais definições, pude concluir que a mentira e falsidade podem ser consideradas sinônimas. Omitir algo, não significa necessariamente mentir. A contradição, além de parecer sinônimo de divergência, na parte que nos explica que “a regra que dá como caráter da verdade a exclusão de toda contradição”, me pareceu mais coerente e apropriada a aceitar contradição como o antônimo de mentira, especialmente quando na seqüência da pesquisa, me deparei com alguns depoimentos de estudiosos em comportamento verbal, que apontam para que mentiras, promessas não cumpridas e omissões podem ser compreendidas quando se investiga a relação entre o comportamento verbal, o que se diz (discurso), e o comportamento não-verbal, o que se faz (ação).

Ora, se isso realmente é verdade, então verdadeiro é afirmar que mentira é deixar de realizar algo que se diz (ação). Isso seria “a mentira”, o antônimo de verdade. Em outras palavras, contradição é fazer diferente do que se promete, do que se diz (teoria – o que se diz; prática – o que se faz, lembra?).

A contradição significa que duas posições não podem ser verdadeiras simultaneamente e no mesmo sentido. Uma coisa, como visto, não pode ser e não ser ao mesmo tempo. E nada que é verdade pode ser auto-contraditório ou inconsistente com qualquer outra verdade. A lógica da coisa depende desse simples principio. Esse, a meu ver, é o ponto chave da questão.

Pode-se dizer que há uma dicotomia, que seria falar a verdade, ou seja, descrever de forma coerente fatos acontecimentos comportamentos ou contar mentira, que seria apresentar uma afirmação pouco adequada ou incompatível com o que, de fato, ocorreu. Tanto falar a verdade quanto contar uma mentira, são comportamentos aprendidos e mantidos pelas conseqüências que pro-duzem, em primeiro lugar, para aquele que fala.

Interessante também, o artigo “a função política da mentira”, de Valton de Miranda Leitão, psiquiatra e psicanalista (http://www.celpcyro.org.br/v4/html/funcaoMentira.htm). A mentira usada politicamente tem uma trajetória tão longa quanto a história da pólis no contexto de suas intrincadas relações.

Tal autor insinua que a ética não pertence ao núcleo da ciência política e dá à mentira um estatuto especial no seu corpo teórico, na medida em que concede ao gover-nante direito ao uso de “meios excepcionais” para alcançar os fins almejados. Curioso, não?

A minha coluna está acabando e esse assunto é muito complexo para ser fechado neste espaço, mas se nenhuma mentira vem da verdade (como visto no versículo), então, concluo a minha tese, a principio, verificando que ser contraditório é mais grave do que ser mentiroso.

Ou estou mentindo?


Luiz Robério F. Dias
Arquiteto e um interessado pacato cidadão de bem.

Cel: 9978-0960
E-mail: luizroberio@globo.com
Twitter: @LuizRoberio
MSN: luizroberiodias@hotmail.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.